A discussão dos trabalhos análogos a escravidão é mais importante do que nunca

Muito tem se falado em escravidão e trabalho análogo a escravidão, o que é estranho para muitos que viam isso como uma questão resolvida do passado. No entanto, as estatísticas dos órgãos oficiais indicam que o número de trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão vem aumentado nos últimos anos.

O que é trabalho análogo a escravidão?

O trabalho análogo à escravidão é caracterizado por condições de trabalho degradantes, jornada exaustiva, servidão por dívida e trabalho forçado, conforme definido pelo artigo 149 do Código Penal Brasileiro. Esta legislação estabelece que reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, ou restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto, é crime, punível com reclusão de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Estatísticas

De acordo com o coordenador-geral de fiscalização e promoção do trabalho decente do Ministério do Trabalho, André Roston, apenas neste ano já foram 2.847 trabalhadores resgatados. Em todo o ano de 2017, quando a reforma trabalhista foi aprovada, o país registrou 648 casos.

Segundo os debatedores, alguns fatos contribuíram para esse crescimento dos casos de escravidão moderna, entre eles a reforma trabalhista e a lei de terceirização. O coordenador do Grupo de Pesquisa sobre Trabalho Escravo Contemporâneo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), padre Ricardo Rezende, afirma que nos contratos terceirizados o crime é mais frequente.

“Isso se dá pelo fato de ter uma legislação que foi fragilizada. A tentativa, por exemplo, de que combinado se sobreponha ao legislado, é terrível, o fato de aceitar a terceirização mesmo para as atividades-fim, porque, em geral, é na terceirização que o crime se dá com maior frequência”, aponta.

O procurador do Ministério Público do Trabalho Luciano Aragão Santos manifestou a mesma opinião. Conforme explicou, há uma interpretação da Justiça segundo a qual o beneficiário final da mão de obra terceirizada não seria responsável no caso de ocorrer trabalho escravo. De acordo com ele, esse entendimento é controverso e ainda depende de julgamento pendente no Supremo Tribunal Federal para que haja uma interpretação definitiva.

Impunidade

Outro fator que contribui para a perpetuação do trabalho análogo ao escravo no Brasil é a impunidade, disseram os especialistas. Padre Ricardo Rezende ressaltou que não há ninguém preso no país por utilizar mão de obra escrava, apesar dos mais de 63 mil trabalhadores libertados desde 1995.

Na opinião do gerente regional do Ministério do Trabalho e Emprego em Caxias do Sul (RS), Vanius Corte, enquanto essa situação persistir será muito difícil combater efetivamente o trabalho escravo, porque ele se torna lucrativo para quem o pratica.

“O trabalho escravo continua sendo um grande negócio. É muito bom ter escravos, manter trabalhadores nessa condição, porque a consequência é muito pequena. Os empregadores encontrados com trabalho escravo são condenados a pagar as verbas rescisórias, mas não condenados criminalmente e, quando são, é raro serem presos. Então, enquanto essa situação de impunidade permanecer, é muito difícil que a gente combata o trabalho escravo”, explicou.

A representante da ONG Environmental Justice Foundation do Brasil, Luciana Leite, relatou que entre 2008 e 2019 apenas 4,2% das pessoas condenadas por trabalho escravo tiveram as sentenças mantidas após recorrer da condenação.

Importância da Atuação Legislativa e da Fiscalização

Os debatedores também enfatizaram a necessidade urgente de uma atuação legislativa mais rigorosa e de um fortalecimento das ações de fiscalização para combater o trabalho escravo no Brasil. A implementação de políticas públicas eficazes e o aumento de recursos para a inspeção do trabalho são essenciais para garantir que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados e que os responsáveis por essas práticas desumanas sejam devidamente punidos.

Além disso, a conscientização da sociedade sobre os efeitos devastadores do trabalho escravo é crucial para criar um ambiente de intolerância a essas práticas e pressionar as autoridades para ações mais efetivas.

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