Mudanças recentes na legislação tributária afetam a segurança jurídica?

Com o objetivo de atingir a meta de déficit zero para o resultado primário das contas públicas, ao final do ano de 2024, consoante previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo federal deu início à missão de incrementar a arrecadação, adotando para tanto o fácil caminho de desconstituir, ou tentar desconstituir, muitas das conquistas e concessões que os contribuintes obtiveram nos últimos 30 anos. Com esse intento, muitas medidas vêm sendo tomadas gerando, certamente, graves impactos na vida daqueles que são por elas atingidos. Ou seja, com o objetivo primeiro e imediato de arrecadar, o que não se oculta, busca-se revogar/alterar institutos de grande relevância em matéria tributária sem que tenham sido tais medidas debatidas com a sociedade e devidamente examinadas em todas as suas consequências. Necessidade de clareza e segurançaA atividade econômica, para crescer de forma ordenada e consistente, necessita de normatização clara e segura, não suscetível de mudanças a qualquer tempo. Essa é a função do sistema jurídico posto, sob pena de se desestruturarem as premissas da economia e se frustrarem os ganhos para a sociedade. É de conhecimento geral que o empresário planeja sua atividade para o futuro de médio e longo prazos, fazendo investimentos que lhe permitam contratar novos negócios e gerar resultados para si e para a sociedade. Por essa razão a atividade econômica não pode ficar ao sabor das diferentes correntes políticas que se sucedam no poder, com orientações diversas, pois a alternância de ideias não é colhida pela atividade do empresário, repercutindo, apenas, nas políticas que venham a ser criadas e das quais ele possa tirar proveitos ou não. O tributo só nasce a partir da atividade econômica capaz de gerar riqueza, mas, ao mesmo tempo, onera essa atividade afetando, diretamente, o desempenho empresarial. Assim, a redução ou aumento dos tributos repercutem na atividade econômica, bem como a política de concessão de benefícios e incentivos fiscais. Princípio da irretroatividadePor essa razão determina a Constituição Federal que as alterações em matéria tributária observem limites em sua aplicação de tal sorte a impedir a aplicação de lei nova a fato passado, o chamado princípio da irretroatividade, bem como a vedação de aplicação de norma nova antes de observados os prazos estipulados no Texto Maior, o chamado princípio da anterioridade que objetiva evitar que os contribuintes sejam pegos de surpresa com alterações legislativas que criam ou aumentam os tributos. Esses princípios impedem indevidas investidas do poder público sobre o patrimônio do contribuinte, ainda que a tais tentativas se dê o nome de tributo. Segurança jurídicaComo afirmado, a atividade empresarial necessita de segurança para florescer, se manter e gerar lucros. A segurança diz respeito à liberdade de atuar e investir, ao ambiente empresarial e à concorrência devidamente regulada, às pessoas que a ela se aplicam, aos modelos de negócios eleitos e tudo o mais que possa ser atributo de empresa, no sentido da lei civil, ou seja, atividade de fazer circular bens e serviços sob as regras da economia. Tudo isso e muito mais, é colhido pelo amplo princípio da segurança jurídica, que não está expresso no Texto Constitucional, mas é pressuposto e está consubstanciado, especialmente, nos princípios da legalidade, anterioridade, igualdade, confiança, moralidade dentre outros. Confiança abaladaO intenso labor do governo federal editando, sucessivamente, normas que alteram critérios de cálculo dos tributos ou revogam benefícios fiscais consolidados no sistema, muitos deles com prazo certo, sem um fundamento que permita identificar uma nova situação social ou econômica que justifique tal medida, abala a crença no princípio da segurança jurídica que orienta a vida não só dos cidadãos como também das empresas. Com isso o contribuinte se vê fraudado na confiança que deposita no poder público, no caso o Fisco, considerando-se que as relações entre eles devem ser pautadas, acima de tudo, pela previsibilidade. Ou seja, não se justifica que com o objetivo único de arrecadar, se proceda a um verdadeiro “desmonte” da legislação, revogando conquistas obtidas pelos contribuintes há tempos. Infelizmente, pelo que se infere dos movimentos do Poder Executivo, nos dias de hoje, corre-se o risco de a segurança jurídica ser, em algum momento, arranhada e, mais, abandonada, afetando de forma grave o ambiente de negócios. Tributação das subvençõesNessa linha a Lei nº 14.789/23 é, certamente, motivo de muito desconforto por parte dos empresários, pois determinou que o montante das subvenções recebidas seja tributado pelo Imposto sobre a Renda (IRPJ), pela Contribuição Social sobre o Lucro (CSL) e pelas Contribuições devidas ao Programa de Integração Social (PIS) e ao Financiamento da Seguridade Social (Cofins), criando em contrapartida um crédito tributário que poderá ser utilizado pelo contribuinte para liquidar débitos ou ressarcir-se, nos termos da lei. EquiparaçãoEssa norma tem sua razão de ser na Lei Complementar nº 160/17, que equiparou a subvenções para investimento todos os benefícios concedidos sob a forma de isenções, reduções de base de cálculo, créditos outorgados e outros, voltados ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A Medida Provisória nº 1.185/23, depois convertida na Lei nº 14.789/23, também incluía as subvenções para investimento voltadas a benefícios regionais (Sudam, Sudene) nessa vedação, o que era uma aberração, por serem autênticas subvenções para investimento, além do fruto por elas trazido para o país. Por ocasião de sua conversão em lei, essa restrição foi afastada (artigo 17). O crédito fiscal, como referido, é igual a 25% do valor da subvenção relacionada à implantação ou à expansão de empreendimento econômico, devidamente protocolado na Receita Federal. Na apuração do crédito fiscal somente poderão ser consideradas as receitas relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação/arrendamento, relativas aos bens de capital aplicados à implantação ou à expansão do empreendimento econômico, desde que computadas na base de cálculo do IRPJ e da CSL. Para fins de PIS e de Cofins, revogou-se a norma que excluía tais verbas à tributação por essas contribuições sociais. Faltou debateA decisão por tributar as subvenções em troca de um crédito fiscal, no entanto, mostrou açodamento por parte das autoridades, pois, no afã de tributar, olvidaram-se elas..

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